Deus, após ter ordenado que Abraão deixasse Ur dos Caldeus para ir à terra de Canaã, faz duas promessas dramáticas ao pai da nação judaica. O pai da fé reage a cada uma delas de uma forma bem diferente da outra.
Primeiro Deus diz:
“Olha agora para os céus, e conta as estrelas, se as podes contar. E disse-lhe: Assim será a tua descendência.” Gênesis 15:5
Confrontado com essa revelação, Abraão responde com uma inquestionável expressão de fé:
“E creu ele no Senhor, e imputou-lhe isto por justiça.” Gênesis 15:6.
E Deus continua com suas promessas:
“Disse-lhe mais: Eu sou o Senhor, que te tirei de Ur dos caldeus, para dar-te a ti esta terra, para herdá-la.” Gênesis 15:7
Mas a esta promessa, Abraão reage com uma objeção:
“E disse ele: Senhor DEUS, como saberei que hei de herdá-la?” Gênesis 15:8.
Em resposta a objeção de Abraão, Deus manda que o patriarca sacrifique uma série de animais, dividindo alguns ao meio, e pondo cada metade em sentido oposto à outra.
Deus faz cair sobre Abraão um sono profundo:
“Então disse a Abrão: Saibas, de certo, que peregrina será a tua descendência em terra alheia, e será reduzida à escravidão, e será afligida por quatrocentos anos” Gênesis 15:13.
A presença de Deus passa então, por entre os animais cortados ao meio, e a aliança entre Deus e Abraão é selada em um episódio que ficou conhecido como ברית בין הבתרים B’rit Bein Habetarim, “Aliança entre os Pedaços”, “um acordo que liga duas partes”.
A palavra hebraica para aliança é b’rit בְּרִית, e de fato era selada pelo derramamento de sangue, e pelo andar entre os dois pedaços de carne.
Uma b’rit não podia ser quebrada, pois constituía uma promessa solene de amor e proteção de um pelo outro, “tudo o que é meu é então seu”.
Muitos estudiosos do Antigo Testamento, já se propuseram a tentar responder os possíveis motivos pela objeção de Abraão à segunda revelação recebida, de que herdaria a terra prometida,.
Algo que aparentemente destoa do texto anterior, já que ele creu que teria filhos em numerosa quantidade.
Porque Abraão questiona Deus sobre a herança da terra? O mesmo Deus que é capaz de dar filhos a um casal estéril, é também poderoso para assegurar a posse da terra aos seus descendentes.
Sem dúvida Abraão acreditava no poder de Deus, por isso esta pergunta “como saberei que hei de herdá-la?”, parece um tanto estranha.
Por outro lado, a resposta de Deus à dúvida de Abraão, também parece estranha, pois anuncia que sua descendência padeceria escrava no Egito.
Como a revelação da futura escravidão dos filhos de Abraão responderia a sua dúvida sobre a herança da terra prometida?
Você pode imaginar isto? Deus falou a Abraão, para ir para a terra de Canaã, e Ele o promete que herdaria a terra.
Mas Deus o revela que primeiro os seus filhos teriam que passar pela escravidão de 400 anos. Porque isso se daria desta forma?
Os estudiosos do Talmude e da tradição oral, apontam duas diferentes abordagens que se conectam com o questionamento de Abraão e a resposta divina à Aliança entre as metades.
A primeira abordagem interpreta que a objeção de Abraão seria a causa da futura escravidão que os filhos de Israel enfrentariam no Egito.
A descida dos descendentes de Abraão ao Egito e sua consequente servidão seria o resultado da dúvida de Abraão sobre a profecia da posse da terra de Israel.
“Shmuel disse: Porque foi o nosso patriarca Abraão punido com a escravização de seus filhos no Egito por 210 anos?
Porque ele questionou o poder de Deus, quando disse, ‘como saberei que hei de herdá-la?'” Talmude Bavli Nedarim 32a.
Na visão de Shmuel, neste momento, a mensagem divina não é de reafirmação da promessa, mas de punição.
“Você duvidou do meu poder, por isso seus filhos irão sofrer escravidão pelas mãos de estranhos, e só depois disso herdarão da terra.”
Mas Shmuel falha em explicar o motivo pelo qual Abraão teria duvidado de Deus. Ele também não consegue responder à pergunta fundamental do porquê os filhos sofreriam punição pelos erros de seus ancestrais.
Isso por que há uma aparente contradição entre dois textos bíblicos que falam sobre o sofrimento e punição dos filhos em relação os pecados dos pais, assunto muito bem abordado pelo Talmude, no tratado Berachot:
“que visita a iniqüidade dos pais sobre os filhos e sobre os filhos dos filhos até a terceira e quarta geração.” Êxodo 34:7
É contraposto por:
“Mas dizeis: Por que não levará o filho a iniqüidade do pai? Porque o filho procedeu com retidão e justiça, e guardou todos os meus estatutos, e os praticou, por isso certamente viverá.” Ezequiel 18:19
“A alma que pecar, essa morrerá; o filho não levará a iniqüidade do pai, nem o pai levará a iniqüidade do filho. A justiça do justo ficará sobre ele e a impiedade do ímpio cairá sobre ele”. Ezequiel 18:20
Ou seja, Deus só pune os filhos pelos pecados dos pais, apenas e somente se os filhos continuarem a cometer os mesmos erros que seus pais.
Assim, esta abordagem não consegue nos esclarecer a objeção e a dúvida de Abraão sobre a herança da terra prometida, e da futura escravidão que seus filhos passariam.
A segunda abordagem, foca não no significado da profecia em si, mas no ritual que acompanha a Aliança Entre as Metades.
“O Rabbi Hiyya Bar Hanina disse: [Abraão não questionou] como um acusador, mas diferentemente, ele perguntou, ‘Em qual mérito [meus filhos herdarão a terra]?
‘ E Deus respondeu, Por meio das expiações que Eu ensinarei a Israel'”. Midrash Rabba Bereishit 44:14.
O rabino Rashi, seguindo a abordagem do rabino Hiyya, explica: “Abraão perguntou, Em que mérito? e Deus respondeu, “Por meio do Sacrifício.””
De acordo com essa abordagem, Abraão não está questionando o poder de Deus. Ao contrário, ele está questionando seu próprio mérito e da sua descendência, para herdar e possuir a terra prometida.
Abraão confia no poder de Deus, mas duvida de si mesmo, da sua própria capacidade.
E esta visão encontra suporte na palavra לרשת lerishta, “herdar”, encontrada no final da promessa de Deus a Abraão, “para dar-te a ti esta terra, para herdá-la”.
Da forma como está conjugada, esta palavra não significa apenas herdar, mas também “conquistar“ e “adquirir”.
Deus está previamente dizendo a Abraão que a terra não será dada aos seus filhos como um “presente”. Eles terão que definitivamente tomar posse da terra, terão de merecê-la para conquistá-la.
Quando o pai da fé percebe que seus filhos terão de participar da conquista de Canaã, ele entende, pela primeira vez, que sua aquisição não é algo dado como terminado ou concluído.
Por isso a objeção de Abraão é entendida, “Como saberei que a minha descendência fará a sua parte? Como saberei que eles herdarão a terra?”
Deus responde a Abraão, assegurando que seus filhos merecerão retornar para sua Canaã. O mérito seria a devoção espiritual dos filhos de Israel, representada pelos sacrifícios que seriam oferecidos através dos séculos.
Isto é reafirmado por meio da simbologia do ritual da Aliança, que demandou derramamento de sangue.
A profecia sobre a escravidão dos filhos de Abraão e sua posterior redenção, e a conquista de Canaã, traçam a trajetória do caminho para a salvação.
Sem dúvida, a terra de Canaã é símbolo tipológico da nossa terra prometida. Deus, através de Jesus nos prometeu um novo lar, uma nova morada.
“Na casa de meu Pai há muitas moradas; se não fosse assim, eu vo-lo teria dito. Vou preparar-vos lugar.
E quando eu for, e vos preparar lugar, virei outra vez, e vos levarei para mim mesmo, para que onde eu estiver estejais vós também.” João 14:2-3
E como saberemos que iremos herdá-la? Como os filhos de Abraão, nós também um dia passamos pela escravidão neste mundo. Mas o filho nos libertou:
“Em verdade, em verdade vos digo que todo aquele que comete pecado é servo do pecado.” João 8:34 “Se, pois, o Filho vos libertar, verdadeiramente sereis livres.” João 8:36
A primeira redenção foi feita por intermédio de Moisés, que guiou os filhos de Abraão, tirando-os da servidão que Deus havia predito, para que herdassem a Canaã terrestre.
Jesus se referia à segunda redenção, que está por vir, para nos dar posse da Canaã Celestial.
E da mesma forma que os filhos de Israel, só herdaremos a nossa terra prometida por meio da conquista. O próprio Jesus falou sobre isso:
“Desde os dias de João Batista até agora, o Reino dos céus é tomado à força, e os que usam de força se apoderam dele.” Mateus 11:12
Mas que força seria essa? É a mesma força usada por Abraão, no seu pacto com Deus, e por seus filhos, a força do sacrifício, do derramamento de sangue.
O Pacto de Deus com Abraão, já apontava para o fato da necessidade do sangue de um inocente, que seria imolado para estabelecer esta Aliança eterna com Deus.
E foi por intermédio desse sangue, o sangue do cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo, que fomos redimidos, libertos da servidão, da escravização do pecado.
E é através desse sangue, e desse sacrifício, é que vem o nosso mérito em herdar a Canaã, que um dia descerá do céu, para morarmos juntamente com Ele.
Essa é a força, o esforço que vence o mundo, crer no sacrifício eterno, que foi oferecido de uma vez por todas, pois o sangue de Jesus nos purifica e nos liberta de toda iniquidade.
O filho é a nossa herança, Ele é o nosso mérito de um dia sermos co-herdeiros de Deus.
“E, se nós somos filhos, somos logo herdeiros também, herdeiros de Deus, e co-herdeiros de Cristo” Romanos 8:17
Essa é a B’rit Bein Habetarim, Aliança de Deus para conosco, que não pode ser quebrada, por meio do sangue, e somente pelo sangue de Jesus, pois foi Ele quem, por meio dos seus sofrimentos, sua morte e ressurreição, conquistou o nosso direito à nossa pátria celestial.
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Veja comentários
Estudo muito elucidativo e enriquecedor
Uma ótima e edificante explicação, qrido irmão. Deus te abençoe.
Shalom do Eterno, Irmão Israel. Que o Eterno(BENDITO SEJA), continue te iluminando e te usando na exposição das sagradas letras. Muito bom o estudo!!! Forte abraço!
AdrianoRibeiro/ São José dos Campos /SP
Ótimo estudo...
Deus abençoe sua vida!!!